O presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz, afirmou na abertura da III Conferência Nacional da Mulher Advogada, em Fortaleza, nesta quinta-feira (5), que recusar a igualdade de direitos às advogadas é negar justiça à metade da advocacia brasileira. Santa Cruz ressaltou ainda que a Ordem, em hipótese alguma, assumirá lugar de silêncio, conforto ou cumplicidade com a injustiça e o machismo na sociedade.
Cerca de 2,6 mil advogadas e advogados, de todos os estados do país, participam da conferência, que tem como tema central “Igualdade, Liberdade e Sororidade”. Ao longo dos próximos dois dias, serão realizados dezenas de painéis, palestras, workshops e atividades, no Centro de Eventos de Fortaleza, para debater e discutir as questões referentes às mulheres na advocacia e na sociedade.
“Temos muito o que refletir sobre a luta das mulheres advogadas e das mulheres em nossa sociedade. Até quando a advocacia brasileira conviverá com uma rotina de homicídio de mulheres dentro de casa, com a violência contra a mulher, com a violência na sociedade, onde o discurso da própria violência parece estar ganhando do discurso da Constituição, da lei e da paz. Não podemos achar normal uma sociedade onde a jornalista mulher é chamada de prostituta, onde a artista mulher é ofendida por pensar diferente da maioria, onde a advogada tem saia medida, onde advogada é algemada”, disse santa Cruz.
Felipe Santa Cruz destacou ainda que realizar a conferência no Ceará é uma homenagem da OAB ao Nordeste, às mulheres nordestinas, como Maria da Penha, que enfrentam toda a sorte de adversidades, mas se revoltam e transformam o mundo à sua volta. Ele falou sobre os avanços obtidos pelas mulheres no sistema OAB nos últimos anos e disse que estes foram apenas os primeiros passos de uma caminhada em busca da igualdade.
“Na nossa conferência nacional, em novembro, teremos paridade nos painéis e palestras, com participação efetiva das mulheres nos nossos espaços de discussão e decisão. Esse é um símbolo desse processo de transformação na OAB, onde as mulheres não estão ganhando nada, mas sim conquistando, por seus esforços, os seus espaços. Apesar das dificuldades, sei que na história do Brasil, a OAB, toda vez que foi chamada, foi vitoriosa na sua trajetória. Espero que esse seja um encontro de muito trabalho, que reflita na vida das mulheres advogadas e de todas as mulheres brasileiras”, afirmou Felipe Santa Cruz.
A presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada (CNMA), Daniela Borges, destacou o legado de lutas das mulheres advogadas no Brasil e a importância dos direitos já conquistados. “Nós, mulheres e mulheres advogadas, somos herdeiras de um legado que nos foi deixado por todas as mulheres que, vindo antes de nós, travaram grandes batalhas, para que estivéssemos exatamente nessa quadra da história. Quadra com desafios imensos e próprios do nosso tempo, mas na qual também usufruímos de direitos conquistados com sangue, suor e lágrimas das gerações que nos antecederam”, afirmou.
Daniela Borges ressaltou ainda as ações e mobilizações do sistema em OAB no enfrentamento à violência contra a mulher e na luta pela defesa das prerrogativas das advogadas, como a aprovação de uma súmula pelo Conselho Federal que impede a inscrição de advogados que tenham praticado atos de violência contra a mulher.
“Queremos o que todo advogado também quer: dignidade no exercício da profissão. Queremos ter nossas prerrogativas profissionais respeitadas. Queremos exercer nossa profissão sem sofrermos assédio, sem sermos vítimas diariamente de preconceito e machismo, sem sermos subestimadas em nossa capacidade e competência, sem sofrermos violência de gênero”, disse a presidente da CNMA.
Ela também citou a necessidade de uma maior representação das mulheres na política. Para Daniela Borges, essa participação é, ao mesmo tempo, garantia da própria igualdade de gênero e também se constitui em um alicerce sobre o qual é possível se almejar transformações mais profundas nas estruturas da sociedade.
“Não há democracia efetiva sem representatividade. As leis elaboradas em nosso país regulam e afetam a vida de todas as mulheres, mas são elaboradas com uma participação mínima de mulheres. Mas mulher na política incomoda. O assassinato de Marielle Franco nos lembrará para sempre o preço que se pode pagar em nosso país por ser mulher, negra, pobre e lésbica”, disse Daniela Borges.
Anfitriã do evento, a vice-presidente da OAB-CE, Vládia Feitosa, defendeu que a luta das mulheres e pelas mulheres deve ser incessante enquanto as oportunidades e os recursos necessários à igualdade não estiverem disponíveis para que todas possam realizar plenamente suas capacidades na vida profissional política e social.
“São inúmeras as barreiras sociais e culturais que nos impedem de atingir nosso potencial, ter voz e ocupar os espaços de fala, decisão e poder. Os dados apontam que as mulheres ganham menos pelos mesmos trabalhos realizados pelos homens, estão mais sujeitas à violência doméstica e ainda desempenham múltiplas jornadas. Por isso mesmo, continua sendo necessário discutirmos problemáticas afeitas à realidade da mulher, que permanecem na invisibilidade, ensejando a falsa concepção de que o tempo se encarrega de resolvê-las, prescindindo de interferências sociais, legais e institucionais para sua melhoria”, afirmou Vládia Feitosa.
Conferência Magna
Ao final da abertura oficial do evento, os participantes acompanharam a palestra magna, com presença da conselheira federal e medalha Rui Barbosa, Cleá Carpi, e da ex-presidente da Ordem dos Advogados de Paris, Marie-Aymée Peyron. As duas destacaram a força da luta das mulheres e as conquistas históricas já alcançadas no Brasil e também na França.