Deu na Mídia: Felipe Santa Cruz defende aprovação das dez medidas contra a corrupção

Comissão de Defesa da Concorrência pede urgência em sabatina de indicados ao CADE
5 de julho de 2019
OAB-PE realiza Congresso de Direito Trabalhista em Caruaru
8 de julho de 2019

Em entrevista à Revista Época, o presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz, defendeu o projeto de lei das dez medidas contra a corrupção, aprovado pelo Senado Federal, na semana passada. Santa Cruz afirmou que a medida manteve o espírito de combate à corrupção e reafirmou que a Ordem foi a primeira entidade a defender a criminalização do caixa 2, presente no texto do projeto, que contou com a relatoria do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

Felipe Santa Cruz disse que a medida acertou ao definir o crime de abuso de autoridade, porque em um Estado democrático de direito ninguém está acima da lei. Ele afirmou ainda que a norma não impõe restrições ao trabalho de juízes e procuradores, sendo uma medida que visa coibir excessos. O presidente da OAB foi um dos entrevistados da seção “concordamos em discordar”, que ouviu também o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Fábio George Cruz da Nóbrega.

FELIPE SANTA CRUZ , 47 anos, fluminense

O que faz e fez: é presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Presidiu a OAB-RJ. Tem mestrado em Direito e sociologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF)

FÁBIO GEORGE CRUZ DA NÓBREGA , 48 anos, paraibano

O que faz e fez: é presidente da Associação Nacional e Procuradores da República. Integrou o Conselho Nacional do Ministério Público e foi procurador-chefe a Procuradoria da República na Paraíba

Qual a sua avaliação sobre o projeto das dez medidas contra a corrupção aprovado no Senado?

FELIPE SANTA CRUZ Acho importante porque manteve o espírito de combate à corrupção. É importante ressaltar que a OAB foi a primeira entidade do Brasil a defender a criminalização do caixa dois, que é um passo moralizante de nossa política.

FÁBIO NÓBREGA Ele traz algumas questões importantes no avanço do combate à corrupção — medidas que, desde o início, constam das iniciativas populares. O ruim é que na hora de votar tenha sido introduzido algo que não tem nada a ver com o tema, que é o abuso de autoridade.

E especificamente sobre o trecho que define o abuso de autoridade?

FSC É um passo importante. Em um estado democrático de direito, ninguém está acima da lei. É óbvio que aquele que abusa do poder que lhe é conferido deve ser responsabilizado.

FN É uma tema que nós entendemos que é relevante. Que, de fato, precisa de uma regulamentação, com cautela, ouvindo todas as partes, e permitindo que se tenha uma legislação nova, objetiva, clara, que traga segurança jurídica. O que difere da que foi aprovada, com tipo subjetivo, de difícil compreensão, que pode, não há nenhuma dúvida, dificultar o trabalho do Ministério Público e da magistratura. É normal pensar que, quando ocorre um clima de incerteza e insegurança jurídica, isso leve a uma dificuldade e até a um receio dos colegas, tanto do Ministério Público quanto da magistratura, de cumprir algumas missões que foram conferidas. Um dos tipos diz “atuar com motivação político-partidária”. Que conceito é esse, o que se enquadra, o que não se enquadra nele? Ninguém sabe, porque não está claro.

Acha que a lei impõe uma espécie de mordaça a juízes e procuradores?

FSC De maneira nenhuma. Até porque aqueles que vão decidir a procedência ou não são os próprios magistrados. É apenas uma medida que visa coibir excessos. Acho que todos os instrumentos legais passam por uma apuração de jurisprudência. Isso é normal. Vamos aprender com a experiência, como é próprio da vida democrática.

FN Para os juízes, há uma vedação quase completa. Para nós, o texto foi formulado de uma maneira tão subjetiva que o que estamos ouvindo é que os colegas, a passar isso, estão com receio de cumprir suas funções do dia a dia, inclusive realizar entrevistas coletivas. Porque não se sabem os limites da lei. Nos parece que funciona mais ou menos como isso ( uma mordaça ).

Diversas alterações foram feitas no texto na última hora, muitas delas atendendo a pedidos de associações de classe. Essas mudanças foram positivas?

FSC Acho que o relator fez um excelente trabalho. É um senador muito talentoso, que é o Rodrigo Pacheco. E um dos talentos de um parlamentar é saber ouvir todos os envolvidos. Houve concessões, as pessoas cederam de parte a parte. Acho que o projeto reflete essas negociações. Foi um sucesso o trabalho do senador.

FN Nós ficamos duas semanas inteiras em discussão com o Senado. Fomos surpreendidos com a notícia de que o processo seria votado de maneira açodada, rápida, sem construção coletiva, sem audiências públicas, como a Câmara e o Senado sempre fazem quando tratam de temas fundamentais. Ficamos preocupados e fomos realmente realizar esse diálogo. A partir do diálogo, vários dos trechos que nos preocupavam foram extirpados, outros permaneceram, e trazem, sem dúvida nenhuma, risco a nossa atuação.

O senhor acha que o momento político é adequado para discutir o abuso de autoridade?

FSC Claro. Houve um grande protagonismo do Poder Judiciário, e a sociedade hoje acompanha, em seu cotidiano, os temas jurídicos com grande atenção. É um momento apropriado porque todos estão atentos a questões como a imparcialidade ou parcialidade de um juiz, os limites de atuação do Ministério Público Federal.

FN Acho que qualquer momento é adequado desde que você tenha um processo transparente, de diálogo, ouça a sociedade, realize audiências públicas. Acho que se esse trâmite fosse um trâmite normal, e não como foi, acelerado, não nos parece que seria indevido. O Poder Legislativo pode tratar desses temas todos, e é importante que o faça. Nós compreendemos que uma norma de abuso de autoridade é relevante.

Outro projeto sobre abuso de autoridade foi aprovado no Senado em 2017, mas está parado na Câmara. Em sua avaliação, ele é melhor que o atual?

FSC Há muitos projetos em tramitação. Há projetos melhores? Há. Mas o projeto atual partiu de uma grande negociação parlamentar. Ele foi o consenso possível. No futuro, nós podemos aprimorar os instrumentos.

FN Os tipos penais daquele projeto de 2017 estavam mais bem descritos. Ainda não era um projeto ideal, mas ao menos ali houve audiências públicas, houve essa construção coletiva. Os textos foram submetidos a um escrutínio público. Quando o processo é construído sem pressa, o resultado final tende a ser muito mais adequado.

As outras medidas do pacote, como a criminalização do caixa dois e o aumento de pena para certos crimes, são positivas?

FSC Sim. É muito importante frisar isso. Todos nós somos a favor do combate à corrupção. O que nós temos de fazer é aperfeiçoar os institutos para chegarmos a um bom termo, sem precisar de justiceiros para combater a corrupção. A OAB foi precursora desse movimento, quando derrubou no STF o financiamento empresarial de campanha, que era uma grande farra.

FN Acho positivo. Mas também acho uma pena que não tenha sido aberta a discussão pública. É possível que tenha gente contrária, que pudesse ser construída alguma forma de consolidação. A Lava Jato, a Greenfield, a Zelotes, todas essas grandes operações de combate à corrupção acabam tendo uma repercussão positiva nesse quadro. Mas, no dia a dia, ainda sentimos que temos uma enorme dificuldade de, ao final, atingirmos não só a aplicação da pena, mas também a recuperação do dinheiro desviado. O sistema precisa ser modificado. Muitas dessas ideias estão no projeto que foi aprovado, outras não.