Nascido na Capital paulista em 8 de janeiro de 1954, o desembargador Renato de Salles Abreu Filho (foto) formou-se pela Faculdade de Direito da Universidade de Mogi das Cruzes, turma de 1980. Ingressou na Magistratura como juiz substituto da 11ª Circunscrição Judiciária, com sede em São Carlos, no ano de 1982. Também trabalhou em Campinas, Nuporanga, Mogi Mirim e São Paulo. Assumiu o cargo de juiz do Tribunal de Alçada Criminal em 2004 e foi promovido a desembargador em 2005. Na última eleição para os cargos de direção e cúpula do Tribunal, realizada em dezembro do ano passado, foi eleito presidente da Seção Criminal para o biênio 2016-2017 e, em entrevista ao Diário da Justiça Eletrõnico, falou sobre projetos de sua gestão e temas ligados ao Direito Penal.
Quais os desafios de sua gestão à frente da Seção de Direito Criminal?
O principal desafio é acelerar o julgamento dos recursos pendentes, especialmente aqueles de processos que envolvam réus presos. A existência de um grande número de réus presos provisoriamente é um problema concreto a ser enfrentado, não só por conta do princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVII, da Constituição Federal), mas principalmente por acreditar que o julgamento definitivo permite a inclusão dos presos em estabelecimentos penais com efetivo trabalho de ressocialização, retirando-os dos Centros de Detenção Provisória. Os recursos criminais já são julgados rapidamente, especialmente liminares de habeas corpus e o mérito de tais recursos, mas pretendemos acelerar esses julgamentos.
Outro desafio é estarmos preparados para receber os primeiros processos que tramitaram em primeiro grau de forma exclusivamente eletrônica. O processo digital, que já é uma realidade nas varas cíveis do Estado de São Paulo, começa a fazer parte do cotidiano de varas criminais, com as naturais dificuldades da inovação e particularidades do processo penal. Mas acredito que as dificuldades serão compensadas por vantagens materiais no processamento de recursos ordinários, com a diminuição de gastos com transporte de autos, movimentação etc.
Que projetos pretende colocar em prática?
Manter e possivelmente ampliar o funcionamento das câmaras extraordinárias, como instrumento para atacar o desafio de reduzir o acervo de processos pendentes de julgamento e discutir a possibilidade de implementar o julgamento virtual na Seção Criminal, assim como já acontece nas outras Seções do Tribunal de Justiça.
Considera que assumir o cargo é o maior desafio de sua carreira? O que o levou a se candidatar na última eleição?
Sim. Após diversos anos atuando como desembargador da Seção de Direito Criminal, acredito que tenha condições de fazer o que precisa ser feito para melhorar o funcionamento da Seção. Como disse, a existência de um acervo de recursos para julgamento e o contraponto entre a repressão ao crime e a tutela da liberdade faz com que o cargo traga uma carga de responsabilidades enormes. Por acreditar que possa contribuir para a solução dessa equação, ou ao menos parte dela, é que me candidatei. Além disso, creio que o cargo de presidente da Seção me traz a obrigação de fazer a representação legítima dos desembargadores e juízes substitutos de Segundo Grau da Seção Criminal junto ao Conselho Superior da Magistratura.
Muito se discute sobre a efetividade das normas de Direito Penal e, principalmente, das relacionadas à execução criminal. Qual sua opinião sobre a questão?
A execução criminal deve ser vista como uma fase necessária e importantíssima do processo criminal. Afinal, pensando-se na recuperação do sentenciado como uma finalidade essencial da pena, não é concebível que a essa fase do processo se destine uma posição secundária. De nada adianta a prisão e a condenação do criminoso se o cumprimento da pena não se mostra capaz de impedir a reincidência e, ao mesmo tempo, torná-lo capaz de viver em sociedade. Bem por isto o Tribunal de Justiça tem buscado melhor a gestão judicial da execução penal, com a criação dos Departamentos Estaduais de Execução Criminal (Deecrims) e o funcionamento da Coordenadoria Criminal e de Execuções Criminais.
Também acredito que em nada auxilia a recuperação do condenado a progressão sem a correta aferição de critérios subjetivos, verificando se o preso de fato está em condições de progredir para o cumprimento da pena em meio aberto ou semiaberto. Manter o preso em regime fechado por algum tempo e depois transferi-lo para meio aberto, sem se ter segurança de que tenha condições de retorno ao convívio social, é descumprir uma das finalidades essenciais do direito penal.
Recentemente, o feminicídio foi incluído no rol de crimes hediondos e como qualificadora do homicídio. Qual sua opinião sobre essa alteração legislativa?
A violência de gênero deve ser combatida, embora seja uma luta dificultada por questões culturais. Entretanto, de nada adianta aumentar a pena, ou tornar um crime hediondo, sem que se efetivem medidas educativas para se evitar que tal violência ocorra. Para as vítimas e seus familiares, pouco adianta aumentar em 1/3 a pena do autor do homicídio por conta do gênero e em situações de violência familiar, ou dificultar a progressão da pena, se a ofensa à vida já foi perpetrada. Talvez uma melhor fiscalização de medidas protetivas, como o afastamento cautelar efetivo de quem já ameaça a futura vítima, tenha melhores resultados para evitar o crime do que um simples aumento de pena.
O que é necessário para o aprimoramento da Justiça Criminal?
Acredito que a maior familiarização com recursos de informática, como a realização de audiências por meio virtual, sem a necessidade de deslocamento de presos, auxiliando na rapidez da solução do processo, bem como a informatização da execução criminal, são medidas importantes para evitar a sensação de demora e não efetividade da justiça criminal.
Também o atendimento de princípios constitucionais de garantia à pessoa, como a realização de audiências de custódia, evitando o encarceramento desnecessário, tende a diminuir a pressão sofrida nas varas criminais e Câmaras pelo grande volume de entrada de processos de réus presos.
Por fim, acho que a melhoria da capacidade técnica da Polícia Judiciária para melhor colher e produzir provas na esfera criminal, como o uso de tecnologia em sentido amplo, tende a melhorar o índice de solução de crimes, apurando sua autoria, bem como permite investigar e apontar os criminosos em novas modalidades de crime, como os cometidos por meio de informática e transnacionais.
N.R.: texto originalmente publicado no DJE de 9/3/16.