Idealizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e em funcionamento há aproximadamente uma década no País, a Justiça Restaurativa tem ganhado corpo nos últimos anos. O método tem como finalidade a solução de conflitos utilizando a criatividade e sensibilidade na escuta das vítimas e dos ofensores por meio de aproximação entre ofendido, agressor, suas famílias e a sociedade na reparação dos danos causados por um crime ou infração. A iniciativa se dá de forma voluntária – e somente quando há reconhecimento de culpa por parte do ofensor – e sua estrutura é voltada à desjudicialização, a partir de princípios como a conciliação e reparação de danos.
Para disseminar a prática e tentar diminuir a ocorrência dos casos de agressões a professores em escolas públicas da região de São José do Rio Preto e reduzir as ações judiciais que envolvem conflitos em escolas, começou a ser desenvolvido em março o projeto Mediação Escolar e Justiça Restaurativa em estabelecimentos de ensino do município de Guapiaçu – a Vara da Infância e Juventude de São José do Rio Preto (sede da Região Administrativa Judiciária que abrange Guapiaçu) registra, todos os meses, a ocorrência de aproximadamente 40 casos de violência escolar.
Durante a aplicação do método, são formados círculos restaurativos (ou processos circulares), nos quais se reúnem a vítima, o ofensor, os familiares e demais atores sociais que possam, de alguma maneira, auxiliar na resolução do problema, ou que sejam por ele afetados. Dessa forma, a Justiça Restaurativa se baseia na corresponsabilidade social do ato.
O projeto conta com a participação do Tribunal de Justiça de São Paulo, do Ministério Público estadual – responsável pela organização de toda a rede –, além de escolas e colaboradores da rede de ensino. Professores escolhidos para serem mediadores receberam treinamento do MPSP e estão aptos a buscar, dentro do âmbito escolar, a resolução de qualquer conflito que ocorra em suas dependências. Litígios de natureza cível, atos de indisciplina e os atos infracionais de menor potencial ofensivo como brigas, discussões e ofensas podem ser mediados pelos professores. Os atos infracionais mais graves permanecem sob a tutela do Poder Judiciário.
Para o juiz Evandro Pelarin, da Vara da Infância e da Juventude de São José do Rio Preto, a Justiça Restaurativa vai aumentar a autoridade do professor em sala de aula. “Precisamos dar aos professores força e poder para que eles possam ensinar e não sejam desrespeitados. Trata-se de um caminho diferente, difícil, mas muito significativo para a pacificação, pois oferece oportunidades para que os envolvidos nos conflitos busquem, eles mesmos, o caminho da paz, o que é sempre muito mais efetivo e duradouro.”
Apesar do pouco tempo de funcionamento, já é possível, segundo o magistrado, identificar nas escolas participantes uma melhor assimilação dos princípios da restauração, com a participação efetiva dos alunos. Atualmente, há, em São José do Rio Preto, 50 profissionais em capacitação, entre supervisoresde ensino, diretores, coordenadores, professores e inspetores de alunos, além de 25 estudantes, que estão sendo capacitados para realizar a mediação no futuro. Em Guapiaçu foram habilitados cinco professores e um supervisor de ensino, que coordena o grupo. “A participação dos alunos mostra que o caminho do envolvimento de todos na pacificação é mesmo um bom prognóstico. Esperamos bons frutos, com mudança nos padrões de comportamento, pela adoção do diálogo, do entendimento e do perdão”, afirma o juiz.
Outra novidade para auxiliar na mediação e evitar a judicialização dos conflitos foi a inauguração, no início de abril, do Setor de Conciliação da Vara da Infância e da Juventude de São José do Rio Preto. O serviço, que está em conformidade com o que prevê o novo Código de Processo Civil, conta com a atuação de cinco facilitadores voluntários cadastrados no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) da comarca, que buscam, por meio da mediação, ajudar a resolver litígios que não tenham sido solucionados no âmbito escolar. Até o momento, foram realizadas 24 audiências envolvendo esse tipo de conflito. “O Setor de Conciliação não está destinado ao atendimento exclusivo de conflitos escolares, uma vez que os facilitadores cuidam de casos diversos. Nas escolas, o princípio fundamental da Justiça Restaurativa é a voluntariedade dos alunos ao programa, mas, quando não há essa voluntariedade, os casos são enviados ao fórum. Grosso modo, o setor funciona como uma espécie de segunda instância de um programa geral de conciliação, deixando a via judicial comoultima ratio”, explica o magistrado.
A previsão é que o projeto seja estendido, nos próximos meses, para outras escolas da região, com a capacitação de novos profissionais para atuar na mediação dos conflitos. Somente em São José do Rio Preto, o tema já está sendo introduzido em oito estabelecimentos de ensino.