Comissão de Defesa do Consumidor é signatária de carta a Bolsonaro pelo fim da cobrança por bagagem

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Brasília – A Comissão Especial de Defesa do Consumidor da OAB Nacional, presidida pela conselheira Marié Miranda, é uma das signatárias da carta aberta enviada nesta segunda-feira (3) ao presidente da República, Jair Bolsonaro, na qual o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) requer a aprovação sem veto à redação final do artigo 2º da Medida Provisória n.º 863/2018. O referido artigo isenta os consumidores do pagamento por franquia de bagagem em voos nacionais.

“O consumidor se encontra em claríssima desvantagem quando precisa pagar para poder despachar malas em voos. A OAB foi a primeira entidade a questionar o conteúdo da Resolução 400 da Anac, que regulamenta a cobrança. Criamos a campanha Bagagem Sem Preço, que foi pioneira nesse sentido e alertou para a necessidade de se debater o tema, e agora se faz necessário que o presidente Bolsonaro sancione esta MP para regulamentar a questão em benefício do consumidor”, aponta Marié.

Além da OAB, também assinam a carta a Associação Nacional do Ministério Públicos do Consumidor (MPCON), a Associação Brasileira dos Procons (Procons Brasil), a Comissão das Defensorias Públicas do Consumidor junto ao Condege, o Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor (FNDC), o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e o Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon).

Leia abaixo a íntegra da carta:

Excelentíssimo Senhor Presidente,

O SISTEMA NACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR (SNDC), aqui representado pela ação articulada da Associação Nacional do Ministério Públicos do Consumidor (MPCON), da Associação Brasileira dos Procons (PROCONSBRASIL), da Comissão Especial de Defesa do Consumidor do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Comissão das Defensorias Públicas do Consumidor junto ao CONDEGE, do Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor (FNDC), do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), e do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON), mostra-se perplexo com as mudanças ocorridas na legislação de transporte aéreo no país, verificadas nos últimos dias, notadamente a partir da edição da Resolução nº 400, da Agência Nacional da Aviação Civil (ANAC), que ilegitimamente se sobrepõem às normas do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor.

As entidades que subscrevem o presente documento requerem a Vossa Excelência a aprovação sem veto à redação final do art. 2º, da MP n.º 863/2018, enviada pelo Congresso Nacional para a sua sanção, a partir das considerações que passam a expor:

Considerando que a Constituição Federal, ao disciplinar os direitos e as garantias fundamentais, elencou, no art. 5°, XXXII, o dever de proteção do Estado diante dos consumidores, “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”;

Considerando o art. 170 da Constituição Federal, que determina que a defesa do consumidor está entre os princípios que norteiam a ordem econômica nacional, na mesma hierarquia de importância da liberdade empresarial;

Considerando que a redação principiológica do Código de Defesa do Consumidor, Lei Federal n° 8.078, de 11 de setembro de 1990, criou um microssistema jurídico que estabelece normas de ordem pública e interesse social;

Considerando já ser do conhecimento de Vossa Excelência que a Medida Provisória n.º 863/2018, além de abrir possibilidade de 100% de capital estrangeiro para companhias aéreas, também determinou o fim da cobrança das malas despachadas;

Assim, em que pesem as recentes notícias de possibilidade de veto por Vossa Excelência de medida tão benéfica aos consumidores brasileiros, as entidades de defesa do consumidor restam preocupadas e apresentam as seguintes ponderações:

1) As duas Casas Legislativas comprovaram que os congressistas estão conscientes dos abusos cometidos e dos sucessivos aumentos do valor da bagagem despachada, que apresentaram índices superiores aos da inflação;

2) Desde a Consulta Pública que culminou na edição da Resolução n.º 400, da ANAC, entidades de defesa do consumidor sempre apresentaram suas preocupações sobre a regra de franquia de bagagens, por violar normas de hierarquia superior como a Constituição Federal, o Código Civil (art. 734), o Código de Defesa do Consumidor e o Código Brasileiro de Aeronáutica (art.222) ;

3) As três empresas aéreas que dominam o mercado nacional abusam do seu poder econômico ao estabelecer regras e cobranças de serviços adicionais aos bilhetes aéreos, acarretando desvantagem econômica aos passageiros;

4) O Congresso Nacional levou em consideração que, desde a vigência da Resolução n.º 400, a ANAC determinou a cobrança da mala despachada, mas não estabeleceu qualquer contraprestação às empresas aéreas em relação à redução dos preços dos bilhetes;

5) Nos últimos dois anos, as companhias GOL e AZUL aumentaram o valor cobrado pelas franquias da bagagem em 67% e 33%, respectivamente;

6) A cobrança da bagagem e seu aumento elevado acima da inflação não podem se justificar pela liberdade tarifária, já que confrontam o Código de Defesa do Consumidor, pois há repasse do risco da atividade negocial ao usuário, existindo, assim, a possibilidade de incorrer em prática abusiva;

7) Apesar de a ANAC determinar que o passageiro pode levar uma bagagem de mão de até 10 kg, ao longo dos dois últimos anos comprovou-se que essa liberalidade de fato não ocorreu, já que, além de as companhias determinarem as metragens específicas da mala de mão, não há qualquer garantia ao passageiro de transportá-la dentro da cabine, uma vez que, reiteradamente, ele é induzido a despachá-la sob a alegação de que a aeronave está com sua capacidade máxima;

8) A inesperada negativa acarreta danos ao passageiro que fica privado de seus objetos de valor e de uso imediato, tais como remédios, produtos eletrônicos, dentre outros;

9) O Brasil possui dimensões continentais com diferenças climáticas acentuadas, havendo necessidade de o passageiro realizar transporte aéreo com mala de 23 kg, que não vincula especificamente a uma mera questão pessoal;

10) Os dados constatam que as companhias aéreas nacionais bateram recorde no transporte de passageiros no último ano. Entre voos nacionais e internacionais, foram 102,4 milhões de pessoas, segundo dados divulgados pela Associação Brasileira de Empresas Aéreas (ABEAR);

11) Em 2018, a Associação Brasileira de Empresas Aéreas (ABEAR) anunciou a alta de 4,1% no total de passageiros, o Brasil registra 22 meses consecutivos nesse crescimento em voos domésticos e 27 meses seguidos de alta em voos internacionais;

12) O Brasil não possui regras claras para a precificação da tarifa aérea, o que prejudica o passageiro consumidor;

13) Não há uma padronização entre as entidades representativas das empresas (Associação Internacional de Transportes e Associação Brasileira de Empresas Aéreas), o que torna o consumidor mais vulnerável em relação à possibilidade de alteração no que se refere ao transporte de bagagens por companhia;

14) Não há análise detalhada do impacto regulatório da norma que indique que haverá prejuízo às companhias aéreas consideradas low cost;

15) A liberdade econômica e tarifária das empresas aéreas não pode ser tratada como único fundamento, sem que sejam respeitados os direitos do consumidor, o Código Civil e a Constituição Federal;

16) A alegação de que se deve aguardar o prazo de análise de impacto para possível revisão da norma, após cinco anos, contraria totalmente o princípio de autotutela dos atos administrativos, que determinam o prazo citado para revogar os atos administrativos;

17) Determinar tal período é impedir inclusive a revogação direta dos atos administrativos, dependendo de decisão judiciária para tanto;

18) A cobrança da mala despachada cria uma falsa expectativa de melhora na prestação de serviço e na diminuição do preço dos bilhetes aéreos;

19) O que ocorre, na realidade, é uma restrição na liberdade de escolha do consumidor, além de não haver análise de impacto regulatório ou estudos claros que demonstrem que tal medida é necessária;

20) Amparado no Relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), podemos identificar o aumento de 20% das ações ajuizadas contra as empresas aéreas no intervalo de 2015 e 2018, sendo 16.175 ações ajuizadas em 2015 e 19.450 no ano de 2018, o que comprova notória insatisfação dos consumidores-passageiros;

A base principiológica do Código de Defesa do Consumidor estabelece a Política Nacional das Relações de Consumo com o objetivo de atender às necessidades dos consumidores, de respeitar à dignidade do usuário, sua saúde e segurança, de proteger de seus interesses econômicos, de melhorar a sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.

É essencial o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo e a necessidade de ação governamental no sentido de protegê-lo efetivamente, pela presença do Estado, no intuito de harmonizar os interesses dos participantes das relações de consumo e a compatibilização da defesa do usuário com a necessidade de desenvolvimento econômico.

Nesse sentido, é de extrema importância viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica, sempre com base na boa-fé e no equilíbrio das relações entre consumidores (passageiros) e fornecedores (empresas aéreas), diante do estudo constante das modificações do mercado de consumo, bem como da análise do impacto regulatório.

Portanto, as entidades que subscrevem a presente Carta Aberta requerem a Vossa Excelência que não haja vetos ao artigo 2º da proposta final da MPV 863/2018, enviada pelo Congresso Nacional.

Brasília, 03 de junho de 2019.

Como membros do SISTEMA NACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR subscrevem as seguintes associações e instituições:

Associação Nacional do Ministério Públicos do Consumidor (MPCON) – Sandra Lengruber da Silva

Associação Brasileira dos Procons (PROCONSBRASIL)- Filipe Vieira

Comissão Especial de Defesa do Consumidor do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)- Marié Miranda

Comissão das Defensorias Públicas do Consumidor junto ao CONDEGE – Patrícia Cardoso

Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor (FNDC)- Cláudio Pires Ferreira

Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)- Teresa Donato Liporace

Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON)- Diógenes Faria de Carvalho